Pirassununga, o Feudo do Século XXI

Onde o poder muda de mãos, mas o comando nunca muda de dono.

Em Pirassununga, o tempo passa, mas o coronelismo parece ter renovado o RG.
É uma entidade viva, hereditária, que atravessa gerações como um sobrenome político. Transcende partidos, fronteiras e até mandatos. Quem nasce aqui, aprende cedo: mudar o prefeito não muda o dono da cidade.

E como se não bastasse o feudo interno, agora temos também as forças externas dando pitaco.
Pirassununga, que sempre foi autossuficiente em seus próprios vícios, agora exporta e importa influência. Forças Lemenses e Ferreirenses começam a aparecer nos bastidores — como se a cidade, além de refém dos velhos coronéis locais, precisasse também de tutores regionais. É o coronelismo 2.0: com endereço fora do CEP.

Dizer que um novo prefeito é imune a críticas é um erro.
Mas negar que Pirassununga ainda vive sob a batuta das velhas raposas é como negar que o sol é quente ou que o céu é azul. Aqui, basta a primeira insatisfação:

“Vamos derrubar o prefeito!”

E o coro se forma, afinado na mesma nota do ressentimento.

Negar que, em uma primeira experiência administrativa, erros não aconteceriam, é de uma ingenuidade quase infantil — mesmo reconhecendo que, em muitos casos, a intenção do chefe do Executivo seja a melhor possível. O atual prefeito, por exemplo, mostra-se um homem preparado, porém ainda tateando no campo minado da política local — um campo onde boa vontade é importante, mas malandragem política ainda decide o jogo.

O recente pedido de cassação dos vereadores do MDB foi mais uma dessas óperas políticas que dispensam roteiro. Tratar aquilo como algo “pessoal” é tão desastroso quanto fingir que hoje não há nada de pessoal nas rusgas entre o presidente da Câmara e o secretário contra o prefeito. O caso já teve seu desfecho jurídico, mas o revanchismo parece ser o esporte oficial do Legislativo. Enquanto isso, a cidade vira palco de intrigas, discursos performáticos e narrativas ensaiadas. Tudo por aplausos, likes e, claro, aumento da fan base.

E é aí que entra outro personagem desse teatro político: o presidente da Câmara.
Político experiente, que já tentou várias vezes ocupar a cadeira do Executivo, mas nunca conseguiu o capital político necessário para isso. Resta-lhe, então, o palco que tem — e a voz que ecoa mais alto quando o microfone está ligado. A velha máxima da política pirassununguense continua valendo: quem não governa, tenta controlar quem governa.

Pirassununga não precisa de salvadores de palanque nem de oradores inflamados. Precisa de gente disposta a entender a realidade municipal — sem achismos, sem pitacos de boteco e sem a arrogância de quem acredita que o barulho substitui o trabalho.

E há ainda o funcionalismo público, essa engrenagem silenciosa que mantém a máquina girando mesmo quando o motorista dorme no volante.
A cidade vive sem um norte administrativo. Funcionários públicos — muitos deles competentes, outros apenas sobreviventes — acabam assumindo as rédeas de ações que deveriam partir de seus chefes. A falta de comando político e a inexperiência de alguns gestores criaram uma geração de servidores que, por necessidade, se tornaram “donos das ações”. E quando o servidor público passa a agir por instinto e não por diretriz, o resultado é previsível: decisões desalinhadas, departamentos desorganizados e uma máquina que trabalha muito, mas entrega pouco.

É importante lembrar, porém, que esse cenário não nasceu agora.
Ele é herança direta de gestões passadas desastrosas, que colocaram à frente de secretarias pessoas completamente despreparadas — nomes escolhidos mais por conveniência política do que por competência técnica. Foram administrações que deixaram cicatrizes profundas na estrutura pública, mas que hoje alguns insistem em romantizar, como se Pirassununga tivesse sido, à época, o melhor lugar do mundo para se viver.
Memória seletiva é um dos esportes preferidos da política local: apaga-se o erro, enfeita-se o passado e reescreve-se a história conforme a plateia do momento.

Ao prefeito, cabe um gesto simples e nobre: baixar o tom, o ego e o discurso. Admitir que, para cumprir promessas, vai precisar de ajuda — inclusive de quem hoje faz oposição. Ser honesto com a própria limitação é mais valente que posar de salvador em campanha permanente. E se as peças do tabuleiro não estão funcionando, troque-as. A caneta foi feita pra isso.

Já o Legislativo precisa entender que derrubar prefeito não é política pública. Se fosse, Pirassununga já seria uma nova Dubai depois de tanta cassação. A cada briga de ego, quem apanha não é o prefeito — é o povo. É o cidadão que fica sem serviço, sem rumo e sem paciência.

No fim das contas, o problema é crônico: muito ego, pouca gestão.
Muita retórica, pouco resultado.
Muita política, nenhum interesse público.

Que Deus, em sua infinita paciência, conceda a essa cidade um lampejo de lucidez — para que, quem sabe um dia, Pirassununga pare de andar em círculos e descubra que o futuro não se constrói com vaidade, mas com humildade.

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