• O Espelho da Imprensa

    Há quem diga que a imprensa é o quarto poder. E talvez por isso, alguns de seus membros acabem se apaixonando mais pelo poder do que pela função.

    Durante anos, certos veículos — ou melhor, certos microfones — ecoaram com suavidade diante de escândalos, contratos suspeitos e atos administrativos no mínimo questionáveis. Tudo convenientemente ignorado, suavizado ou transformado em pauta branda, recheada de perguntas combinadas, respostas ensaiadas e encenações de ocasião. O jornalismo virava roteiro, e a verdade, figurante.

    Agora, em tempos de nova gestão, a mesma imprensa redescobre sua vocação de cão de guarda. Multiplicam-se os discursos inflamados, as suspeitas amplificadas, as teorias por trás de cada nomeação ou compra pública. O tom é de urgência, a pose é de indignação, e a pauta virou palco.
    Só esqueceram de contar ao público que, até pouco tempo, esses mesmos microfones estavam ligados diretamente às tomadas do poder anterior.

    A seletividade da crítica é sutil para alguns, escancarada para outros. Não há problema em cobrar. É papel da imprensa.
    Mas quando a lupa só funciona para um lado, e a lanterna se apaga nos porões de ontem, a verdade deixa de ser objetivo e vira instrumento.

    Essa forma de fazer jornalismo — com indignações sob demanda e chiliques performáticos — pode até render audiência, curtidas e sensação de protagonismo.
    Mas credibilidade… ah, essa se constrói com constância, coerência e memória.

    E é justamente aí que a imprensa tropeça: ao esquecer que quem grita hoje, mas silenciou ontem, não informa. Representa.

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